sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Artigo: O Horário Político, a Comunicação e outras considerações


Por Anna Karenina 4085/BA
Maori Jornalismo Opinativo

Hoje, enquanto almoçava, tive a ocasião de assistir os horários políticos dos dois candidatos à Prefeito de Salvador, Pellegrino do PT e ACM Neto do DEM, em disputa do segundo turno. Confesso que fiquei boquiaberta com a capacidade de produção, nível técnico, discurso e linguagens empreendidas em ambas produções audiovisuais pelos profissionais das agências de Comunicação contratadas para tal. Quase me senti, ao assistir os programas, uma verdadeira cidadã soteropolitana, que via diante daquelas imagens a elucidação da maioria das mazelas sociais na capital baiana. Quase acreditei em tudo o que foi dito. Foi um show de emotividade, fios de cabelos arrepiados, um sentimento de cidadania irrompendo a alma social... Nas telas, o endeusamento de reles mortais aclamados pelo povo, beijos, abraços, um carinho desmedido que, salvo engano, mais intenso aos carinhos cedidos a um primo ou sobrinho pequeno, quem sabe. De repente, o povo e sua situação tornaram-se a prioridade, nunca antes vista, e que agora, estão ali com candidatos muito comovidos com a situação da cidade, da pobreza e do caos, solícitos e com valoroso altruísmo, por pura bondade, a sanar as condições que levam às privações e sofrimento dos filhos de São Salvador.
É incrível a capacidade que os Meios de Comunicação têm de tocar na alma do espectador. Vence quem for mais criativo, mais penetrante no poder audiovisual no que tange, move e toca os sentimentos e emoções humanas. Esse é o segredo de uma comunicação poderosa.
E olhe que eu estudei e conheço parte do que permeiam os processos de produção dos produtos comunicacionais e os efeitos previsíveis que eles podem causar e gerar num meio social. E, ainda sabendo, fui tocada e quase me convenci de que toda aquela narrativa é vida real, quase esquecendo que se trata apenas de uma construção linguística narrativa, de um discurso meticulosamente pensado no Plano de Comunicação proposto para uma estruturação audiovisual, voltada para atingir em primeiro nível fins imateriais. Posso explicar porque primeiro imateriais. Os fins imateriais também estão situados no campo dos sistemas de crenças, signos e valores que as ciências exatas não podem prever. A Comunicação Social faz isso muito bem. Isto é, estão imersas no universo da Cultura, onde um filete pode ser o escopo que se abre para milhares de centelhas que podem compor um universo. Até que o eleitor se convença por toda aquela parafernália de bombardeamento de informações, e venha apertar na urna eletrônica eleitoral o número do seu candidato, e seu candidato seja eleito, os fins imateriais foram bem trabalhados.
Para os fins materiais, posso discorrer dizendo que isso as ciências exatas podem prever: depois da massificação de um sistema de crenças no aparelho cognitivo do povo, o sistema econômico e financeiro que uma Prefeitura pode ocasionar para a legenda de um partido, do candidato e, sobretudo de como as verbas recolhidas pelos impostos do município poderão, de fato, serem revestidos em retorno material para contemplar a sociedade como um todo, podem ser vistos como fins efetivamente materiais, porque impactam diretamente na vida das pessoas, na constituição concreta das coisas de um meio.
E fui tocada de tal modo que me encontro aqui agora escrevendo sobre isso, sendo instada a parabenizar a equipe técnica de Comunicação tanto de Pelegrino como de ACM Neto, que conseguiram os dois, tocar na alma. 
Faço essa reflexão, sobretudo, acerca do poder e capacidade que os Meios de Comunicação, no caso, o televisivo, para ilustrar como as estruturas políticas conseguem entrar na cabeça do povo com suas ideias. E digo povo, porque é para o povo que os programas políticos estão direcionados. É do povo que eles conquistam a maioria dos votos e podem ser eleitos. Porque pertence ao povo o verdadeiro poder de eleger e retirar quem o povo quer. Só que nisso tudo entra um aspecto imprescindível: a formação crítica que um povo vai ter para escolher quem ele quer a serviço da sociedade que pertence. E não o comportamento que o povo tem assumido: acreditar que um representante político é um patrono que vai colocar peixe, frango, cesta básica e farinha em sua mesa, gasolina em seu veículo, e dinheiro na mão para um comprar e você vender o seu voto. A amplitude é muito maior.
É preciso que o POVO, com letras garrafais, seja o verdadeiro fiscalizador das práticas políticas, um inibidor da corrupção, um povo que censure quaisquer intenções que o levam a se corromper. É preciso que o povo seja exemplo para os candidatos, de postura,  retidão, trabalho, conhecimento e principalmente, vergonha na cara. É preciso que o povo saiba que um governo é o reflexo de quem o elege. E se o povo vende seu voto por cinquenta reais, ele pode entender a consequência do que levou a morte de seu filho assassinado pelo narcotráfico, por exemplo, bala perdida, falta de assistência nos hospitais, entre outras coisas. Os esquemas de corrupção que o povo contribui e contribuiu para serem formados nas células públicas - porque ele vendeu seu voto por cinquenta reais ou de outras formas - é fruto da negligência e leviandade do Poder Público Legislativo, de quem o compõe, os eleitos, do Poder Público Federal que deveria fiscalizar, coibir irregularidades e cobrar mais eficazmente para prevenir os desvios, e principalmente, o cidadão, que deve participar dos espaços e ser esse agente social ativo nos espaços públicos. No entanto, ao invés de proteger seu filho para que o mesmo não permanceça em risco, vulnerabilidade social e marginalizado, o eleitor que vende seu voto é verdadeiramente quem financia as próprias mazelas sociais a que vive, imaginando que carnaval, copa e vale refeição família puramente dignificam o homem. Porque as mazelas sociais são de responsabilidade de todos os cidadãos e principalmente do Estado, que deve cumprir e ser fiel à Constituição, grifo cidadania. Mas até que ponto isso tem sido respeitado?
Infelizmente a Eleição se transformou numa gincana, principalmente com a alta tecnologia das impressões de tinta a laser, nas gráficas, mídias eletrônicas e papelotes, como se candidatos fossem mercadorias. Quem dá mais? O que vou ganhar com isso?
A maioria dessas relações tem acontecido com base no interesse, custo benefício, troca, apadrinhamentos, bel prazer e conveniências. Agora eu pergunto: onde reside o verdadeiro sentimento do ser Político? Promover o bem social, da coletividade, trabalhar a serviço de todos, respeitar o Direito, ou promover o bem estar social de quem é conveniente? Ou...? Ou...? Ou...?
Porque existem muitas possibilidades. O fato é que a Humanidade vive uma crise de valores, assim prefiro pensar do que convencer-me de que o Homem preferiu destituir-se do Ser que é para se tornar a própria coisificação. Por mais que o sistema seja uma coisa que desenvolvemos e nos apropriamos para nosso benefício, e que as pessoas tendam cada vez mais a se relacionar na linguagem das coisas, ainda é eminente a cultura e os princípios dos valores humanos, de onde brotam suas raízes no processo de identidade e pertencimento cultural, que vêm de berços tradicionais e ancestrais. E é isso que eu acredito que ainda deva ser superior às coisificações do mundo, e que prevaleça no íntimo das pessoas, porque todas têm uma origem, embora novas formas trabalhem há algum tempo para a destituição do que é o Ser Humano, para tornarem-se mutantes ou humanoides, com a perversão de valores que muito se vê.
Por opção própria, sou apartidária, não defendo uma coligação, pessoa ou partido, porque acredito que a base social é composta por uma formação heterogênea  e que a classificação e o enquadramento podem ser perigosos para uma visão ampliada, já que pode existir certa restrição de ótica em casos de pertencimento de grupos.
Acredito que o importante em todo esse processo é a consciência das intenções intimistas no coração de cada um, de cada ser político e cidadão, onde quer que atue, interaja e o que faça. O que vale nisso tudo é o conhecimento, a consciência do que se faz e a projeção de onde se origina o sentimento. Sabendo que a consequência só virá depois. E do depois, é só depois, mas é o resultado que vem da intenção íntima. Se a intenção íntima estiver voltada para a aspiração verdadeira coletiva, como processo proativo, contributivo, benfeitor e generoso, subtraindo-se da avareza, vaidade, egoísmo e individualidade, então tudo o que for plantado se multiplicará. E isso é a irrigação de uma sociedade inteira.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

A eleição do Samba, depois das urnas


Neste domingo, 7 de outubro, o Clube do Samba reunirá, em Ilhéus, músicos e sambistas numa tarde regada pelo melhor ritmo da música popular brasileira. Confira a seguir mais informações sobre o samba em Ilhéus e no Brasil.

Por Anna Karenina 4085/BA
maorilevejunto@gmail.com

Após a votação das eleições, em 7 de outubro, às 13 horas, se inicia a melhor programação do domingo, no Clube do Samba, em Ilhéus, situado na Avenida Aliança, nº 51, bairro da Conquista. Músicos, artistas, poetas, agentes culturais e apreciadores da mpb se reunirão para apreciar o som de Herval Lemos, Irmão, Sérgio Nogueira, Cláudio Vieira, Luana e Eloah Monteiro, músicos conceituados e amantes do samba. Ingressos R$10,00.

O Clube do Samba é uma casa de confraria formada no ano de 2007, em homenagem ao ilustre cantor e intérprete ilheense, Joãozinho Alfaiate (in memoriam) por uma geração ativa e conceituada de sambistas, intérpretes, compositores e instrumentistas, que se reúnem para fazer música elevada de alta qualidade sonora. Presidido pelo percussionista Jorge Ivan Rodriguez, filho do homenageado e casado com Agda Silva, o Clube é composto pelos músicos Délio Santiago, Herval Lemos, Sérgio Nogueira, Gil Lucas, Priscila Benevides, Irmão, Djalma, Luizinho, Cláudio Vieira, Luana e Lito Vieira.

Um pouco de História

Natural de Ilhéus e nascido em 8 de março de 1929, Joãozinho era músico de rua e costumava tocar bolero e samba nos bares da cidade, geralmente no Bar de Treita da Avenida Itabuna, no Bar Capixabinha do bairro da Conquista e na Maré Mansa, da Cachoeira do Roça. Casou-se com Lélia Rodriguez Araújo, com quem teve sete filhos, e, junto com seus contemporâneos, formou um grupo de seresta marcando a história do samba na cidade.

A “Velha Guarda” pode ser lembrada em Ilhéus por nomes de músicos como os de Seu Gordura (in memoriam), considerado o mestre de todos os cantores, e Odraude, personalidade que vivenciou a época em que o bolero, a seresta e o samba se misturavam nas cantorias e salões da década de 1950 em diante. Assim acontecia o samba mesclado com outros ritmos nos bailes dançantes no antigo “Berro D’água”, onde é hoje Hotel Opaba, no Pontal, em Ilhéus. Ligado nas manifestações culturais da cidade, Odraude é uma personalidade formidável e distinta que guarda, em suas lembranças existentes, relatos que marcaram época, assim como hoje guardam os músicos Mão Branca e Antônio Muniz, contemporâneos de Joãozinho Alfaiate, ao lado de Clovis Farias e Assis.

Pano pra manga

Própria da cultura humana, a música é uma arte capaz de tocar a alma, com seus gêneros, arranjos, melodias e ritmos. Sem dúvidas, o samba é um estilo musical que se diferencia dos demais pela sua cadência e embalo peculiar, tornando-se eminente o poder de atrair e envolver as pessoas no seu compasso e emanação de musicalidade elevada. O gênero surgiu no Brasil com origem de raiz africana, e é considerado como uma das principais manifestações da cultura popular.

Mas, no Brasil, onde o samba teria nascido primeiro? Na Bahia ou no Rio de Janeiro? Fontes tradicionais de informação na internet, com referências da Biblioteca Nacional, como A Wikipédia Enciclopédia, apontam que como gênero, o samba é entendido como uma expressão musical urbana do Rio de Janeiro. Mas, anteriormente, a pesquisa demonstra que dentre as características originais do samba, “a dança é acompanhada por pequenas frases melódicas e refrões de criação anônima, alicerces do samba-de-roda nascido no Recôncavo Baiano”, que só chegou no Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX. Para quem conhece mais sobre essa cultura popular, sabe que o samba-de-roda é uma manifestação que está inserida junto com a capoeira. Estudos e os próprios relatos das ladainhas de antigos mestres da Bahia apontam que a capoeira nasceu em Santo Amaro, cidade situada justamente no Recôncavo Baiano.

A letra da música “Onde o Rio é mais baiano”, de Caetano Veloso, por exemplo, diz que “A Bahia/ Estação primeira do Brasil/ Ao ver a mangueira inteira nela se viu/ Exibiu-se sua face verdadeira/ Que alegria/ Não ter sido em vão o que ela expediu/ As Ciatas para trazerem o samba pro Rio/ (Pois o mito surgiu desta maneira)”. A construção da letra, sua linguagem e ornamentação de palavras, evidenciam a forma de surgimento do samba no Brasil e um mito em torno desse evento. A música “Pelo Telefone”, é considerada o primeiro samba gravado em disco no Brasil, em 1917, no Rio de Janeiro, criada na casa de “Tia Ciata”, personalidade baiana soteropolitana, onde se frequentavam vários músicos quem teriam criado o primeiro samba gravado. Mas “Pelo Telefone”, é uma canção com autoria reivindicada por Ernesto dos Santos, conhecido como Donga, com co-autoria do cronista carnavalesco, Mauro de Almeida.

Tia Ciata, cozinheira e mãe de santo, de nome Hilária Batista de Almeida, foi uma ativista em animar e ajudar a difundir a cultura negra nos raízes das favelas cariocas, e é em menção à ela que o trecho da música de Caetano Veloso “As Ciatas para trazerem o samba pro Rio/ (Pois o mito surgiu desta maneira)”, insinua que na verdade o samba nasceu na Bahia, que tentaram levar o samba pro Rio, mas que é um mito que ele seja de origem carioca. A letra “Samba da Benção” de Toquinho e Vinicius de Moraes, narra que “Porque o Samba nasceu lá na Bahia/ E se hoje ele é branco é na poesia/ Ele é negro demais no coração”.

A saideira, por favor!

Jorge Ivan, filho de Joãozinho Alfaiate, que tem como referências musicais João Gilberto, Novos Baianos, Vicente Celestino, Gilberto Alves, Oswaldo Fael, Morena Belado, João Nogueira, Os Mutantes, o MPB de Gabriel Santiago, e estilos como o Fox, Bolero, Jazz, Blues do Texas, entre outros, ratifica que o samba veio mesmo da mãe África e defende com veemência que, no Brasil, nasceu sim na Bahia. O músico ilheense Herval Lemos, concorda, e acresce dizendo que só depois Tia Aciata levou o samba para ser difundido no Rio de Janeiro. Para o músico soteropolitano Cláudio Vieira, “o samba é como um transe espiritual, a expressão de todos os orixás nessa manifestação cultural”.

Lemos reflete dizendo que “o Sol é para todos. Mas a arte na sua essência, sem influência de nada, em função somente do amor, é para alguns”. Ele explica que “existem vários tipos de samba, como o samba-canção, samba-de-breque, samba-exaltação, samba-enredo, samba-rock, samba-de-roda, partido alto, chula, bossa nova, samba-de-gafieira, samba-reggae, samba-do-criolo-doido, entre outros...” Para ele, a base instrumental para fazer samba parte principalmente do pandeiro, cavaquinho e tamborim, em seguida o violão, chocalho, timbau e agogô.

Podemos citar canções como “As Meninas de Batom”, composição de Herval Lemos, “Dias de Samba” e “Salve Salvador”, de Sérgio Nogueira, “Bang bang” de Gil Lucas, “Mandinga”, de Cláudio Vieira, como obras que resultaram dos encontros sambistas etílicos no Clube do Samba, e que aos seus modos peculiares narram, traduzem e guardam a memória das pessoas, emoções e sentimentos despertados durante inspirações poéticas e musicais.

Felizmente existem recintos onde quer que estejam situados, é possível encontrar pessoas que exercem a mesma atividade, modo de vida ou apreciam uma determinada cultura, e que possuem particularidades em comum, por afinidades de gostos, e perceber um sentimento de uma unidade confraterna – e isso acontece há milênios nas diversas formas de organizações e sociedades dos grupos humanos. E o Clube do Samba é assim, um acontecimento onde você sente sua raiz na música do samba, nesse processo de identidade cultural.